segunda-feira, dezembro 11, 2006

desenganar

Depois de dois meses juntos, tudo o que fazem agora é ficar cada um em sua própria casa. Ele a proibiu de vê-lo; ela está assustada.

Durante longas horas, todos os dias, ele rejeita seus telefonemas, suas tentativas de contato. Está ocupado demais construindo uma imagem dela, que, jura, permanecerá nos anais da literatura lírica por tempo infinito.

Ela está puta, porque se recusa a transformar-se num totem. Deseja apenas amá-lo.

Hoje, ele se recusa novamente a vê-la. Prefere pensar que está morta: tanto melhor para o poema que tenta escrever, no qual compara o rosto de cadáver que ela ostenta com a alvura das colunas da Acrópole. Deseja torná-la o arquétipo do amor perdido, da paixão irrefreável e absoluta que leu em tantos poemas e que viu em tantos filmes do cinema mudo, que viu expressa nas telas dos mestres e nas esculturas clássicas. Não namora mais uma garota, mas uma idéia, ainda que essa idéia esteja batendo em sua porta nesse exato minuto e tentando chamá-lo de volta à razão abandonando essas intenções estúpidas.

Impávido, ele tampa os ouvidos e busca visualizar sua amada imortal, falecida sobre a tumba de Lenora; morta, morta, morta.

Ela esmurra a porta e castiga a campainha:

- Eu estou aqui, idiota! E não num livro!

Ele agarra o abridor de cartas e aproxima-se da porta trancada, ansioso para dar vazão a sua verve poética.

Um comentário:

Stephanie disse...

1)cefalive é um remédio para dor de cabeça;

2) ser mulher não é tão ruim assim. Na verdade eu gosto muito. Só fico meio puta quando a vida é mais difícil por causa disso.

Fêmeas quem não querem ser eternamente a boa mocinha de família, se conformar com 'um homem pra chamar se seu' e se arriscam a abandonar certas convenções moralista-classe média, quando não matam dois leões, matam um e deixam o segundo bem fodido pra morrer no dia seguinte quando ela sai à caça outra vez.

mas não se assuste, querido, há certos temas que precisam ser escritos cortante, para que o leitor sinta parte do drama

não estou querendo acabar com sua crença no mistério

Por falar em drama, veja o caso dessa mulher. Ela não quer ser um totem (certíssima!) e lá está o imbecil querendo idealizá-la. Ele não quer a mulher, quer a idéia dela. Existem vários assim por aí, guardadas as proporções.

um cheiro

PS. carta, vc merece, mas só haverá Stephie para tal no fim do período...